Um dos temas mais polêmicos atualmente no Brasil são
as mudanças propostas para o nosso Código Florestal. Por ser um tema bem
complexo e de grande importância para todos nós resolvi analisar a questão a
fundo e produzir esta postagem, além dela o Dia de Política promoverá um novo debate acerca do tema, dia 19
(sábado) às 21h, no perfil discussoesbr@hotmail.com
do MSN.
Antes
de qualquer coisa, o que é o Código Florestal? É uma seção da legislação
brasileira que define regras sobre o que pode ou não ser explorado das
florestas do país. Ele define, além de outras medidas, as APPs (Áreas de
Preservação Permanente) e as Reservas Legais, que são os principais
mecanismos que protegem as florestas ou cerceiam a atuação dos produtores no
Brasil – e neste ponto que entra a polêmica do código.
A
grande discussão entre ambientalistas e ruralistas é que, sobe o ponto de
vistas destes, o código atual limita muito o crescimento da atividade
agropecuária no país, enquanto que aqueles defendem que o código deve ser
aprimorado ampliando as proteções as florestas.
Nos
próximos parágrafos vou explicar melhor tudo isso.
História
O
primeiro código foi criado em 1934 pelo governo Getúlio Vargas, reformulado em
1965 em vigência do presidente Castello Branco, além de várias emendas e
medidas provisórias que alteraram seu conteúdo (vou falar das mais importantes
no decorrer da postagem).
Mas
para entendermos melhor a função deste código é necessário lembrar de
acontecimentos anteriores a ele, principalmente sobre as formas de exploração
da natureza com fins econômicos durante o decorrer da história do Brasil. Me
refiro principalmente aos anos coloniais, onde a principal atividade econômica
brasileira era o extrativismo e o plantio de uma única cultura para exportação
(o que exigia retirar a natureza local para se poder produzir).
Essa
forma de explorar a natureza continuou depois da independência do país, e
perdura até os dias atuais, sejam pelas consequências que ela causou ou pelo
projeto econômico que deixou nos locais em que foi implantado.
Destarte,
o governo criou uma legislação específica sobre a exploração e a preservação de
áreas naturais no país, leis que não se aplicam somente a Amazônia, mas para
todo o país. Essas leis sofreram diversas modificações ao longo dos governos,
vamos focar aqui o projeto vigente e as mudanças propostas nele.
Mudanças nas APPs e Reservas Legais
Segundo
o código atual as Áreas de Preservação Permanentes são a vegetação nativa de
margens de rios, lagos e nascentes (tendo como referência o período das
cheias); várzeas e mangues; matas de restinga; encostas; topos de morros; e
áreas com altitude superior a 1.800 metros. Segundo o código vigente as APPs
englobam as seguintes áreas:
-
30 metros para cursos d’água de até 10 metros de largura;
-
50 metros para cursos d’água ente 10 e 50 metros de largura e no entorno de
nascentes de qualquer dimensão;
-
100 metros para cursos d’água entre 50 e 200 metros de largura;
-
200 metros para cursos d’água ente 200 e 600 metros de largura;
-
500 metros para cursos d’água com largura superior a 600 metros;
-
100metros nas bordas das chapadas.
A
proposta atual, que foi aprovada na Câmara dos Deputados em 24 de maio deste
ano, mantém boa parte destes parâmetros, contudo, propõem concessões em
diversos casos. As principais modificações propostas são:
-
admitir culturas lenhosas perenes, atividades florestais e de pastoreio nas
APPs de topo de morro, encostas a altitudes superiores a 1.800 metros;
-
para cursos de água de até 10 metros de largura prevê a preservação de somente
15 metros de mata ciliar (metade do código vigente);
-
permite a manutenção de atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e de
turismo rural nas APPs se estiverem em áreas consolidadas até 22 de julho de
2008;
- outras
atividades poderão ser liberadas por conselhos estaduais.
No
atual Código Florestal as Reservas Legais são as proporções dos terrenos de uma
propriedade em que a mata nativa não pode ser explorada. No código vigente essa
porcentagem que deve ser obrigatoriamente preservada é calculada excluindo as
APPs e varia de acordo com a região, onde:
-
na Amazônia Legal equivale a 80% da propriedade;
-
no Cerrado a 35% da propriedade;
-
demais regiões e biomas do país é de 20% da propriedade.
Concessões
de exploração podem ser feitas por órgãos municipais, estaduais e
federais (como o SISNAMA e o IBAMA).
No
código em discussão as porcentagens da propriedade em que a preservação da mata
nativa é obrigatória não varia, entretanto, as áreas de APPs podem ser
incluídas no cálculo caso estas estejam preservadas e não implique em novos
desmatamentos na propriedade.
Outro
mudança são para pequenas propriedades, onde aquelas que possuírem até 4
módulos fiscais (módulo fiscal é uma medida determinada pela INCRA, contudo,
ele varia de estado para estado, entre 5 e 100 hectares) poderão considerar
como Reserva Legal a vegetação nativa existente desde 22 de julho de 2008,
sendo ela uma APPs ou não.
Além
disso admite-se exploração econômica das Reserva Legais com autorização do
SISNAMA e a supressão das matas nativas de acordo com o órgão
responsável pela área (que pode ser municipal, estadual ou federal).
Áreas consolidadas, punições e anistia
Áreas
consolidadas são regiões de APPs ou de Reservas Legais que foram degradadas ou
utilizadas para alguma atividade produtiva (edificações, benfeitorias e
atividades agrossilvopastoris). Na atual legislação estas áreas devem ser
recompostas, regeneradas ou compensadas obrigatoriamente, enquanto que as
modificações em discussão dispensa as pequenas propriedades (até 4 módulos
fiscais) de recompor essas áreas.
Abrangendo todas as propriedades, o
projeto de lei em discussão define que quem desmatou antes das definições dos
percentuais de reservas legais (ano 2000) deverá manter as áreas de proteção
segundo a lei vigente da época.
Quanto
às punições, o atual código prevê pena de três meses a um ano de prisão e multa
de 1 a 100 vezes o salário mínimo para quem descumprir qualquer uma das
exigências da lei além de sanções ao produtor não tiver sua Reserva Legal
registrada no cartório competente.
O
código que está sendo discutido propõe as seguintes mudanças:
-
isentar proprietários rurais de multas e sanções por utilização irregular até
22 de julho de 2008;
-
para ter o perdão das dívidas o produtor deverá se comprometer, legalmente, a
regularizar sua propriedade segundo os novos parâmetros da lei;
- produtor
que se inscrever Cadastro Ambiental Rural e aderir ao programa de regularização
será suspenso de qualquer punição.
A
anistia esta inclusa nas modificações descritas acima, onde, segundo os
ambientalistas, são punições muito brandas e causarão devastação legalizada a
floresta a ponto de prejudicar todo o ecossistema, principalmente o amazônico.
Emenda 164
Uma
emenda constitucional alterou o texto aprovada na Câmara dos deputados, esta
que determina algumas exceções quanto as APPs, são elas:
- a
manutenção de atividade agrossilvopastoris, de ecoturismo e de turismo rural se
estiverem em áreas consolidadas até 22 de julho de 2008;
-
outras atividades poderão ser permitidas pelos estados por meio do PRA (Programa
de Regularização Ambiental);
-
atividades de utilidade pública, interesse social ou de baixo impacto ambiente
serão definidos por lei.
Ambientalistas Versus Ruralistas
O
principal argumento dos ruralistas para as modificações propostas em nosso
Código Florestal – que é um dos mais rígidos e completos do mundo – é que ele
engessa o crescimento da agropecuária brasileira – diminuindo nossa
competitividade no mercado internacional -, além de prejudicar a agricultura
familiar em todo o país.
Refutando
os argumentos dos ruralistas, estudos da USP revelam que a área cultivável do
Brasil pode ser dobrada caso as áreas que hoje destinam-se a pecuária de baixa
produtividade fossem realocadas para o cultivo agrícola.
Além
disso, pesquisadores da USP, UNESP e UNICAMP publicaram cartas em revista internacional
alertando que caso o novo Código Florestal seja aprovado haverá um decréscimo
acentuado na biodiversidade, um aumento da emissão de gás carbônico, ampliação
das áreas afetadas pela erosão do solo, o que implicará em mudanças climáticas
drásticas para os moradores da região amazônica.
Outras
pesquisas também indicam que o código vigente não prejudica a agricultura
familiar, contudo, não são dados precisos, pois são estudos generalizados, não pesquisas
de campo em contato com o ambiente e com a vida destes pequenos produtores.
Economia
Um
fator importante que deve ser levado em consideração na análise desta polêmica
é a importância da agropecuária na balança comercial brasileira. A quem não
saiba, a balança comercial é a diferença entre as exportações e as importações
de um país. Onde, normalmente, quando as exportações superam as importações é
sinal de crescimento.
No
caso do Brasil temos uma balança comercial positiva, vendemos para o exterior
mais do que compramos. Até aqui tudo bem, mas quando estudamos mais a fundo
percebemos que nossa balança comercial só é positiva graças à agropecuária. Vou
explicar melhor.
Se separarmos
nossas importações e exportações por setores, como eletrônicos, produtos
manufaturados, vestuário, e etc., percebemos que as commodities (forma com que
chamam os produtos do setor primário nas bolsas de valores) são de importância
vital para nosso crescimento, ocupando cerca de 60% da nossa pauta exportadora.
Ou
seja, nos outros segmentos nossa balança comercial ou é deficitária (compramos
mais que vendemos), ou estamos bem próximos desse patamar, enquanto que nas commodities
o cenário é completamente diferente, vendemos muito além do que compramos.
Desta
análise temos que considerar que o crescimento da agropecuária é importante
para o Brasil, contudo, crescer não significa somente plantar em mais áreas,
mas também ser tornar mais produtivo por área plantada, ou melhor dizendo,
melhorar as técnicas de plantio para produzir mais onde já existem plantações –
que é o argumento dos ambientalistas nesse âmbito.
Situação atual
O
projeto do novo Código Florestal foi aprovado na Câmara dos Deputados em 24 de
maio deste ano e desde então está em discussões em diversas comissões do Senado
federal (entre elas a Comissão do Meio Ambiente – CMA). Nestas discussões
surgiram diversas novas emendas.
Após
a análise destas comissões o projeto vai para o Plenário do Senado, depois
volta para a Câmara dos Deputados, onde será decidido qual texto irá para a
sanção ou veto da presidente - ou o que a Câmara aprovou em maio ou o texto que
vier do Plenário.
Movimentos envolvidos
Sem mais delongas, quem estiver interessado em saber mais sobre estas discussões vou listar alguns links abaixo. Ademais, reforço o convite para participarem do debate dia 19, as 21h via MSN. Basta adicionarem o perfil discussoesbr@hotmail.com e trazer seus pontos de vista para a discussão.